Aborto espontâneo: luto no primeiro trimestre

Ter uma gestação interrompida no primeiro trimestre é bastante comum, mas isso não diminui a dor e a angústia de quem perde o bebê

Cerca de 20% das gestações terminam em aborto espontâneo

Ao completar oito semanas de gestação, a arquiteta Adriana Alves Brier, de 39 anos, descobriu que seu bebê não estava se desenvolvendo como deveria. Aconselhada por sua médica, realizou diversos exames para descobrir o que havia de errado. No terceiro ultra-som, ela recebeu a má notícia: já não existiam mais batimentos cardíacos.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a perda do bebê antes da 22ª semana de gravidez é classificada como aborto espontâneo e o risco maior se dá até a 12ª semana de gestação. As causas podem ser várias: anomalias cromossômicas, problemas no colo uterino, infecções, entre outras. Adriana afirma que sua ginecologista alertou sobre o risco de ter uma gestação interrompida: “Ela até sugeriu que eu esperasse os primeiros meses para espalhar a novidade, já que na primeira gravidez é muito comum perder o bebê”, lembra.

Segundo a ginecologista e obstetra Flávia Fairbanks, especializada em Sexualidade Humana pela USP, aproximadamente 20% das gestações terminam em aborto espontâneo e, de acordo com a obstetra Anna Bertini, da Unifesp, cerca de 90% destas perdas ocorrem no primeiro trimestre. “Na metade das vezes, é por máformação genética do bebê, mas há também problemas relacionados ao útero ou hormonais”, explica Flávia.

No entanto, o motivo da perda nem sempre fica claro. Flávia explica que, quando uma mulher sofre um aborto espontâneo pela primeira vez, não é comum investigar as causas. Os médicos costumam ir mais a fundo na investigação quando a mulher perde o bebê pela terceira vez. “A perda de repetição, como chamamos, obriga uma investigação minuciosa, analisando todas as possíveis causas”, diz.

Sonho perdido

Muitas mulheres não são informadas pelos médicos das chances do aborto espontâneo no início da gravidez e ficam assustadas quando isso acontece. A obstetra Anna conta que não costuma passar esta informação. “Se a paciente perde o bebê, contamos que é algo comum, que na maioria das vezes acontece porque o bebê não estava bem formado e que ela irá engravidar novamente”, diz. Para a médica, informar uma mulher feliz com a notícia de uma gravidez de que o aborto espontâneo ocorre em 20% dos casos é desnecessário e negativo.

Flávia conta que, na maioria dos casos, as mulheres descobrem a gravidez por meio de um teste e já começam a sonhar com o filho. “Nem passa pela cabeça que podem perdê-lo”, comenta. Segundo a psicoterapeuta e psicanalista Léa Michaan, o vínculo afetivo da mãe com o bebê já está formado quando ela recebe a notícia da gravidez. “Quando ocorre o aborto espontâneo, todos os sonhos e expectativas são tirados e a mãe costuma viver o luto pela perda do filho e da mãe que ela imaginaria ser para ele”, explica.

Além deste sofrimento, que se torna maior quando a gestação já está mais avançada, há casos em que a mãe se culpa por não ter se cuidado mais ou fantasia que o problema ocorreu pela sua incapacidade de reprodução. “Mas o mais útil e produtivo é entrar em contato com a realidade e entender que é um fato natural da vida”, afirma Léa. No entanto, de acordo com a psicanalista, esta fase de aceitação ocorre aos poucos. “É necessário que os amigos e familiares estejam por perto e não façam pouco caso do ocorrido”, diz.

Neste momento, a mulher precisa sentir-se compreendida em todas as questões psicológicas e físicas que envolvem a perda do bebê. Adriana lembra que os meses seguintes foram os piores, e que todo o processo do aborto foi muito angustiante para ela e o marido. Embora saiba que ainda existe a possibilidade de engravidar novamente, ela afirma que está um tanto confusa quanto a outra tentativa. “Ao mesmo tempo em que você quer muito, fica pensando que não quer passar por todo esse sofrimento de novo”, explica. “Neste momento, eu ainda não tenho uma resposta”, diz.

Mesmo que muitas mulheres fiquem com medo de partir para uma segunda tentativa e algumas delas pensem que há algum problema físico, a psicanalista Léa afirma que, quando é possível engravidar novamente, a maioria não hesita. “Uma vez que o grande consolo é o fato de que elas terão outras oportunidades para se tornarem mães, a grande maioria tenta novamente”, afirma Léa.

 

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